Esta é uma das questões mais
polêmicas e controversas na psicologia, e ela começa pela própria definição de
nossa ciência: Afinal de contas, que tipo de ciência é a psicologia? Se olharmos
bem onde a Psicologia se situa nas áreas de concentração nas Universidades
brasileiras, grande parte delas a situará no campo das ciências humanas, outra
parte a situará na área de Ciências da Saúde, e ainda uma pequena parte no
campo das Ciências Sociais... Porém, há casos mais interessantes: O de uma
grande universidade brasileira que, na década de 80 e 90 ainda situava a psicologia
como uma Ciência Exata... Ora, o motivo disso é simples: Havia uma grande
influência das ideias de cientificidade no modelo positivista, fruto de uma
longa história de dependência de modelos científicos, sociais e culturais
norte-americanos.
Todavia, o modelo ao qual nosso
país estava habituado foi gradativamente dando espaço à novas formas de
pensamento, com uma maior difusão do pensamento europeu e soviético no país,
com especificidade para os modelos fenomenológicos e marxistas, e outros
modelos pós-modernos. O que acontece é que estas teorias que começaram a
circular pelo país trouxeram com elas novas reflexões, das quais as bases
advinham do campo epistemológico.
A psicologia positivista àquela
época, com seu modelo naturalista, mecanicista e reducionista trazia uma visão
de ciência em cujo repertório constavam termos como “Objeto de Estudo”, “neutralidade”,
“Separação Pesquisador-Objeto” e coisas do gênero.
O pensamento fenomenológico,
corrente de pensamento muito fecunda na Europa, veio para o Brasil
especificamente através de correntes humanistas, existencialistas, mas
principalmente através da Gestalt Terapia, e possuía uma visão diferente de
mundo, onde o objeto não era visto isoladamente, mas em RELAÇÃO com o mundo, e
este passava a nominar-se FENÔMENO. Esse foi um passo importante para a quebra
da hegemonia das ideias positivistas nas ciências.
O pensamento marxista, germinado
na antiga União Soviética durante muitos anos, adquiriu maior força acadêmica
na América Latina após a crise na psicologia social da década da década de 70.
Esta forma de pensamento trouxe a ideia de que a psicologia não tratava
simplesmente de um objeto, mas sim de um processo. E neste sentido, podia-se
compreender que os processos eram “fenômenos em movimentos” que só seriam
acessíveis através da dialética.
A partir dos anos 50, uma
revolução começou a ocorrer no pensamento mundial: Começava a cibernética! Este
movimento cujo pensamento nasce nas ciências da informação/informática foi se
desenrolando em etapas que ficaram conhecidas como “ondas”. A segunda onda da
cibernética, especificamente, influenciou bastante o pensamento psicológico a
partir da década de 1970, que se relacionou especificamente com outras três
correntes de pensamento epistemológico que deram novos rumos ao pensamento da
psicologia: O construtivismo, o pensamento sistêmico e a teoria da
complexidade.
O construtivismo possui várias
influências e várias linhas de pensamento, dentre os quais, um dos mais famosos
é o suíço Jean Piaget (1896-1980), psicólogo desenvolvimentista, criado da
epistemologia genética. Este pensamento basicamente entende que o objeto é
CONSTRUÍDO a partir da ação do sujeito sobre ele.
O pensamento sistêmico por sua
vez, entende não um objeto de estudo, mas sim um sistema, que é um conjunto de
fatores que se influenciam em interações mútuas. Ou seja, o objeto se tornou
múltiplo, neste sentido.
O pensamento complexo
caracteriza-se por se aberto, onde o objeto o é igualmente. É um
objeto-processo-sistema-fenômeno, que ocorre em um tempo espaço concreto que
está em constante construção e desconstrução. O objeto é configuracional, pois
depende de uma série de arranjos que se encontram disponíveis no ambiente.
Desta forma o objeto é auto-eco-organizado, ou seja, depende da sua relação com
o tempo, espaço e com a materialidade para se constituir. É uma teoria de
emaranhados que se baseia na cibernética, no pensamento sistêmico, na
fractalidade e na caoticidade do mundo. Descrevendo-a assim parece ser muito
complicada, mas o fato é que difícil mesmo é o caminho de abandono de crenças
positivistas que foram arraigadas no pensamento científico ocidental durante
décadas, para a compreensão de novas formas de pensamento.
Em suma, o que apresento de forma
bastante simples é que, mesmo que não pareça, existem várias formas de se
pensar a psicologia, construindo um corpo de saberes plural e
multiparadigmático e que nós, enquanto pensadores desta ciência, devemos voar
para fora das caixas que limitam o nosso pensamento.
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Imagem: Extraída do Google Imagens
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Murillo Rodrigues dos Santos, psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC
Goiás (Brasil), com graduação sanduíche pela Universidad Católica del Norte
(Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados
Unidos) e pela Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela
Universidade Federal de Goiás. Atualmente é Pesquisador pela CAPES e presidente
da Rede Goiana de Psicologia.
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