Talvez esta seja uma das coisas
que mais fazem as pessoas procurarem os psicólogos ao redor do planeta terra:
Problemas sentimentais. E eles podem ser de várias ordens, relacionados à
própria pessoa ou aos outros, podem ser de várias intensidades, modos ou
enfim... Apesar de ser muito amplo tal espectro, gostaria de centrar a nossa
reflexão a respeito de uma classe: A relação a dois.
Desde que nos entendemos por
gente, fomos ensinados pela sociedade, pelas tradições ou pelos livros sagrados
das religiões que o “ser humano não foi feito para viver só”, e com base nisto,
e outras “cositas más” a sociedade
foi se estruturando diariamente em relações monogâmicas e estabelecendo níveis
de relacionamentos e ritos de passagens: Namoro, Noivado, Casamento, etc., que
variam em relação a forma e às vezes conteúdo, de cultura para cultura, mas que
possuem relativa base em comum.
Se formos olhar simplesmente pelo
viés evolutivo, viver com outra pessoa é algo que proporciona a “manutenção da
espécie” ou a maior possibilidade de ter sucesso na “seleção natural”...
Todavia, o ser humano é um ser dotado de intencionalidade e subjetividade, e de
uma infraestrutura que o permitiu se converter em um ser social que permite
construir sentidos objetivos e subjetivos de existência: A partir disso, não se
pode mais enxergar a vida a dois somente como uma mera estratégia de
sobrevivência, pois na medida em que o ser humano cria novos sentidos à esta
experiência, e a tecnologia o ajuda a superar as intempéries da guerra
biológica pela preservação da espécie.
Pois bem, o objetivo deste texto
não é trabalhar sobre a origem da monogamia, do amor, ou dos ritos de
acasalamento socialmente constituídos e travestidos por rituais e tradições,
mas de fazer uma reflexão sobre as dinâmicas relacionais existentes na vida a
dois.
Vamos partir do pressuposto de
que o objetivo de um relacionamento entre pares consentidos é a felicidade, e
esta é alcançada através de uma coisa chamada amor (seja lá o que isto seja,
pois esta é uma das coisas mais difíceis de definir ou de descrever em meu
ponto de vida [e de muita gente]...). Sigamos também a ideia de que uma relação
não nasce pronta, mas é construída na medida em que as individualidades dos
pares se constituírem em uma unidade afetivo-simbólica que não suprima as vontades
dos sujeitos que a compõe. Outro pressuposto que gostaria de tomar é de que a
relação a dois é baseada em uma série de “contratos psicológicos” estabelecidos
de maneira consciente e inconsciente, e que os mesmos são estabelecidos por
consenso e modificados de igual forma. Outra coisa que devemos assumir como
premissa neste texto, para compreender melhor o objetivo do mesmo é: Uma relação
é dinâmica e a sua manutenção é de responsabilidade de ambos os integrantes.
Então o que quero dizer como
final disso tudo?! Ora, temos duas possibilidades para vivermos nosso
relacionamento, e falo isto com muito temor, pois sempre fui um dos combatentes
de dualidades na psicologia, mas acredito que aqui é onde se pode traçar o
limiar entre uma dualidade e uma “dicotomia” - Somos seres que resultaram de
incontáveis anos de evolução social, e foi esta evolução social que, de alguma
maneira nos colocou diante de uma escolha sobre duas posições morais: Ou
vivemos nossas relações de maneira altruísta, ou de maneira egoísta! Isso não
quer dizer que, tenhamos que escolher conscientemente entre uma ou outra, ou
que se o fizéssemos, viveríamos infinitamente em um dos polos e repeliríamos o
outro. Não! Afinal de contas, é impossível ser 100% altruísta ou egoísta em um
relacionamento (e aqui eu poderia recorrer a incontáveis filosofias milenares
como a do TAO, na tese do Ying e Yang, em que um pouco de bem sempre está
contido no mal e vice-versa; ou na filosofia do Cristianismo, onde o mal emana
de criaturas que são feitas à imagem e semelhança do criador)...
Enfim, o que quero levantar com
este texto é que, relacionamentos são feitos à nossa imagem e semelhança,
contraditórios e surpreendentes, e que temos a escolha de vivermos baseando
nossos relacionamentos em amor ou em simples jogos de poder, e que tal escolha
não é tão simples assim. O que temos que fazer é pensar sobre as dinâmicas
afetivas em que nos colocamos: Estamos respeitando a individualidade do outro?
Estamos vivendo de maneira a saber mediar de maneira saudável a relação entre o
“eu”, o “você”, e o “nós”?
Ora, nossos relacionamentos são
construídos pelas decisões que tomamos, pela maneira que agimos e pensamos, e
não simplesmente pelo que sentimos. Para compreender essa dinâmica de
relacionamentos a dois onde vivemos, não há um segredo à priori, como uma receita para todos, mas a uma das melhores
maneiras é, sem dúvida alguma, aprender a relacionar-se consigo mesmo, pois não
existe amor ao próximo que resista à falta de amor próprio. E para finalizar,
devemos parar de buscar respostas mágicas para nossos problemas emocionais: Ou
encaramos o que temos no presente momento de forma madura, ou iremos viver na
eterna terra do “se”, que nunca respondeu ou aliviou inquietação de ninguém.
Acredito ainda, piamente, que devemos parar de buscar respostas prontas para
tudo na vida, e encaramos nossos problemas como construídos por nós mesmos (lidando com eles), ou
viveremos em uma eterna transferência de nossas responsabilidades para o mundo.
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Imagem: Extraída do Google Imagens
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Murillo Rodrigues dos Santos, é psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC
Goiás (Brasil) com graduação sanduíche e estágio em terapia
sistêmico-relacional de casais e famílias pela Universidad Católica del Norte
(Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados Unidos)
e Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela Universidade Federal
de Goiás (Brasil). Atualmente é pesquisador pela CAPES e presidente da Rede
Goiana de Psicologia.
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