quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Quer ser feliz no amor? Então declare guerra à Hollywood!




Ah, o amor, esse sentimento nobre que é descrito há centenas de anos pelos poetas, filósofos, pensadores, e por fim, psicólogos... E é por isso que eu estou aqui, talvez para fazer o papel de advogado do diabo e desmascarar algumas questões ocultas a respeito de tão falado sentimento.

Em primeiro lugar, tenho que confessar que não estou tão certo que o amor seja um sentimento. Como assim, Sr. Psicólogo? É isso mesmo! Acredito que o amor, seja ele o que for, é muito mais complexo do que um simples sentimento. Aliás, se ele fosse fácil de descrever, eu mesmo escreveria um tratado de algumas dezenas de páginas e ficaria rico vendendo a receita para a felicidade através dele!

Mas vou tentar expressar alguma coisa do que eu entendo sobre o amor. Para mim a mais bela e precisa definição do amor advém de um verso da Bíblia:

“E sobretudo, revistam-se do amor, que é o vínculo da perfeição” Colossensses 3:14

Este verso foi escrito por Paulo de Tarso no século primeiro para uma comunidade de cristãos que viviam na cidade de Colossos na Grécia Antiga, e de uma forma bem singela, traduz algo a respeito do amor. Acredito que Paulo chamou o amor de “vínculo da perfeição” pelo simples fato de ser a expressão maior da complexidade das relações humanas. Explico, o amor não é uma simples emoção ou sentimento, mas um conjunto de emoções e sentimentos que é revestido de vontade humana, que se concretiza em uma decisão. Complicado? Explico melhor: O amor não é um simples sentimento de “bem querer”, e isso é visível no fato de que muitas vezes, mesmo amando uma pessoa, podemos sentir uma raiva muito grande dela, nos cansar, termos dúvidas, sentimentos ruins e bons, alternados e ao mesmo tempo... é um turbilhão de coisas que nos atropela e volta. Soma-se isso de uma “vontade”, um querer, um desejo, fazendo com que, na síntese dos sentimentos e dessa vontade, haja uma escolha da pessoa por amar. Por isso, eu definiria o amor como um contínuo de sentimentos, vontade e decisão. É perfeito porque é completo, expressa a nossa orientação de “bem querer” mesmo no “mal querer”.

Contraditório? Sim! E talvez a pessoa que melhor tenha expressado esta relação contraditória tenha sido um poeta português dos século XVI, Luis Vaz de Camões, ao escrever o famoso poema, do qual adjunto uma parte:

“Amor é fogo que arde sem se ver
É ferida que dói e não se sente
É um contentamento descontente
É dor que desatina sem doer”

Bom, o amor parece ser isso, uma grande relação que se expressa em contradições e que tem como fim último a felicidade em si que se contenta na felicidade alheia. E aqui eu tenho que diferenciar uma coisa, e é onde eu digo que há que se travar uma guerra contra Hollywood: O amor não possui formas ou receitas, ele acontece no caminho. O amor é um método peripatético* de vida, ou seja, ele acontece enquanto caminhamos e vivemos.

O problema disso é que, em uma sociedade onde o amor foi industrializado pelos romances hollywoodianos, onde a estética é endeusada (pois o amor é lindo nos filmes), há uma grande crise de angústia ao perceber que, o amor, é mais uma ética do que uma estética! Antes de ser belo, ele tem que ser bom, e o bom não é necessariamente ligado ao prazer, ao gozo! O bom está ligado ao essencial, ao que é necessário para que se viva com plenitude. Por isso que há que se declarar guerra contra Hollywood: Não devemos comprar um ideal de amor vendido por cenas cinematográficas realizadas sob às estrelas, ou com histórias comoventes – o amor é uma decisão de se viver mesmo quando não há pianos tocando sob a luz de velas.

O protesto que devemos fazer é este: Não devemos comprar um ideal de amor fabricado por uma empresa! Não devemos submeter nosso amor à Deus, ao próximo, ao cônjuge, à família, a nós mesmos, pelos ideias feitos por Hollywood. Afinal de contas, a inconformidade gerada pela desilusão criada pela dissonância fantasia/realidade é imensa, e causa angústias de vida no indivíduo.

Não escrevo este texto como um “pessimista” do amor, mas escrevo contra a inversão do valor deste: Antes de tudo, o amor é uma orientação de vida, é uma ética, para depois disso se tornar uma estética. E esta estética (beleza) é feita no caminho. Por isso, é necessário caminhar, viver sem cultivar fantasias disfarçadas de expectativas, pois esperando um grande final, perde-se toda a beleza do caminho.

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*Peripatetismo: É um método de ensino desenvolvido por filósofos gregos clássicos, inicialmente por Aristóteles, e posteriormente apropriado por Jesus de Nazaré, cuja essência era “ensinar caminhando”. Ou seja, os filósofos se reunião em grupos ao ar livre, e saíam pela cidade passeando e filosofando, usando os elementos do caminho para refletir, ensinar e aprender.

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Imagem: Extraída do Google Imagens

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Sobre o autor:

Murillo Rodrigues dos Santos, é psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC Goiás, com graduação sanduíche e estágio Terapia Sistêmico Relacional de Casais e Famílias pela Universidad Católica del Norte (Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados Unidos) e Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela Universidade Federal de Goiás (Brasil). Atualmente é pesquisador pela CAPES/MEC e presidente da Rede Goiana de Psicologia.

Sobre a Rede Goiana de Psicologia

A Rede Goiana de Psicologia é uma organização estadual de coolaboração acadêmica e profissional, criada no ano de 2014 com o objetivo de fortalecer a nossa a psicologia enquanto ciência e profissão através de uma série de projetos. Quer saber mais sobre nós? Clique no link "sobre nós" no menu principal.

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