A recente execução de um
traficante de drogas brasileiro na Indonésia e, a iminente execução de outro,
está em plena evidência na mídia e nas Redes Sociais, despertando inúmeros
pontos de vistas a respeito da validade ou proporcionalidade da punição, e
ainda mesmo despertando opiniões de curiosos e da população em geral.
Basicamente as opiniões se dividem entre as duas máximas: “Ele errou, estava
sujeito às leis daquele país e deve pagar. Deveria ter pena de morte para
traficantes no Brasil também”, e sob o ponto de vista contrário defende-se que “Existem
direitos humanos universais, como a inviolabilidade da vida diante de um justo
julgamento”.
Mas a pena de morte é uma questão
nova? Não! Ela existe desde o início dos tempos. Aliás, a lei atual se baseia
em um aperfeiçoamento histórico da punição aos infratores: Desde as
civilizações mesopotâmicas, semitas, árabes, greco-romanas clássicas, asiáticas
até as ocidentais modernas (e contemporâneas), há pena de morte. Nos dias de
hoje, conforme dados da Anistia Internacional (2013), existe cerca de 60 países
que ainda aplicam a tal punição no mundo como política de justiça. Mas, se
parece ser um assunto político relativamente comum, ainda que cruel sob pontos
de vista humanitários, porque logo agora a comoção do povo brasileiro para este
tema?
Simplesmente porque não há pena
de morte no Brasil, e que o brasileiro executado pela Indonésia foi o primeiro
na história de nosso país a ser condenado com tal punição. Enfim, mas o que eu
pretendo discutir aqui não são os aspectos jurídicos ou humanitários a respeito
da execução do brasileiro, já existe muita gente por aí falando sobre isso. O
que eu pretendo com este texto é fazer uma conexão entre a Psicologia, a
Política e a História, de modo a compreender o porquê, em pleno século XXI, um
país adota uma medida considerada desproporcional sobre o nosso ponto de vista.
Quando adoto o termo “desproporcional”
sei que vou de desencontro aos argumentos inflamados dos que dizem que o
tráfico de drogas é o responsável pela morte de milhões de pessoas no mundo, e
grande parte delas no Brasil, e etc, etc, etc. Eu responderia este tipo de
argumento citando o fato de que, quando um governo legitimado pela população,
implanta uma política de justiça punitiva, e não educativa, ele está SE
VINGANDO e não PROTEGENDO o povo. Está adotando medidas populistas para agradar
o emocional de uma parcela movida pela verborragia assassina de direitos
humanos universais, e não se diferencia em nada e uma horda enfurecida baseada
em uma emocionalidade cega e sedenta por sangue. ”Ah, mas os traficantes matam
sem dó, porque teríamos dó deles” argumentam alguns, e a isso eu responderia:
Por uma questão de nobreza! Quando um governo se vale do assassinato para punir
assassinos, ele se rebaixa ao nível deles e perde a sua legitimidade. Penas de
morte desta maneira provam que ainda não saímos da barbárie do “olho-por-olho e
dente-por-dente” do famoso Código de Hamurábi, da era Mesopotâmica em 1700 A.C.
Mas porque a Indonésia mantém uma
pena que parece aos nossos olhos brasileiros, ser tão desproporcional? Em
primeiro lugar pelo choque cultural ao estabelecer a morte como política
oficial de Estado. Já citei isto ao falar que o Brasil é um país onde tal fato
não existe, e adiciono o fato de que a morte não é algo “natural”
psicologicamente ao ser humano, afinal de contas, se o fosse nosso psiquismo e
organismo não lutariam até o fim para evitá-la.
Mas o que sustenta um pensamento
de um país a validar uma política destas? Aqui há a questão de uma proposta de
governo, adotada politicamente por um presidente que se comprometeu a passar
uma imagem de “Linha dura” no combate ao tráfico de drogas. Em sua campanha
presidencial, Joko Widodo, fazia sua campanha com uma imagem de que seria duro
em relação às políticas antidrogas.
Mas somente a ideia isolada de um
líder, se não tiver embasamento, pode se considerar frutífera. E o país a
encontrou na sua história: A Indonésia é tão “implacável” com relação às drogas
porque historicamente foi um país devastado por elas. No século XIX, ocorreu
entre Inglaterra e China a famosa guerra do Ópio, onde a primeira
contrabandeava toneladas e toneladas desta droga pesada para o segundo país.
Todavia a Indonésia entrou no pacote como um efeito colateral, pois apesar de
ser uma rota para o “comércio” da droga, também passou a ser um mercado
consumidor para a mesma.... Bom, a história já se ocupou deste capítulo, mas o
que acontece é que no desfecho dele, tais países quase foram devastados pela
droga.
Se juntarmos estas peças, podemos
entender o que há por trás do pensamento indonésio ao sustentar a pena de morte
de maneira a não ser clemente com apelos internacionais. Juntam-se a ideia de
um presidente que busca passar uma imagem positiva para o povo, e uma história
manchada pelas drogas que quase destruiu o país, e tem-se o seguinte panorama.
O que eu gostaria de explicitar
neste texto é o fato de que existe uma estrutura de pensamento por trás das
decisões políticas dos países e eles não nascem do nada, mas são construídos
historicamente e devem assim ser compreendidos, e qual estrutura de pensamento
também deve ser acessível aos psicólogos.
Quem sabe fazendo uma ampla
reflexão sobre o tema, poderemos compreender e buscar melhores maneiras para a
construção de políticas públicas de enfrentamento às drogas, pois este é um
problema universal, e não só de um país como a Indonésia, que sofreu com o ópio
há séculos, ou do Brasil, cuja droga da “moda” é bem mais barata, e atende pelo
nome de “Crack” (ou qualquer outra).
Referência
Anistia Internacional (2013).
Pena de Morte 2013: Fatos e dados. Disponível em: https://anistia.org.br/noticias/pena-de-morte-2013-fatos-e-dados/
no dia 18 de Janeiro de 2015.
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Imagem
Extraída do Google Imagens.
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Murillo Rodrigues dos Santos, é psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC
Goiás (Brasil), com graduação sanduíche na Universidad Católica del Norte
(Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados
Unidos) e Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela Universidade
Federal de Goiás (Brasil). Atualmente é pesquisador pela CAPES/MEC e presidente
da Rede Goiana de Psicologia.
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