sábado, 28 de fevereiro de 2015

O que o vestido preto com azul/amarelo com dourado pode ensinar sobre psicologia clínica?




Chata pra caramba! Foi assim que ficou essa polêmica para algumas pessoas no Facebook. Outros ainda estão descobrindo do que se trata. Alguns, como a minha avó, por exemplo, nem sabem ainda do ocorrido e pouco importa isso para ela. Mas o fato é que uma foto de um vestido, portadora de uma das mais perfeitas ilusões de ótica já vistas na rede nos últimos tempos, despertou a curiosidade de muita gente.

Muitos psiquiatras, neurologistas e neuropsicólogos já falaram sobre o caso, falando sobre o que ocorre com o fenômeno: O fato é que os olhos não são os responsáveis por decifrar nenhum tipo de informação, eles são apenas responsáveis por captá-las e enviá-las para a área Occipital do cérebro, que é a responsável pela organização e interpretação dos estímulos da visão. Mas não vamos por este lado... nosso foco é a psicologia clínica!

Outra coisa interessante desta imagem é que ela foi capaz de mostrar para as pessoas que, coisas tidas como tão exatas ou certeiras, são tão relativas como as julgadas “subjetivas”. E não é de hoje que o tema das cores pode ser relativizado: Daltônicos por exemplo possuem uma percepção de cores diferentes da maioria das pessoas por uma simples alteração biológica.

Ora, vamos traçar alguns paralelos: Nossas sensações e percepções possuem intrínseca relação com o nosso biológico, mas só existem quando este aparato está em contato com a estimulação oferecida pelo meio ambiente, e o fato é que o mesmo estímulo (como a foto de um vestido) pode gerar diferentes tipos de reações. Tal fato também se dá com as emoções: Possuem um substrato endocrinológico, são formuladas no sistema límbico cerebral, são sentidas em determinados momentos em partes do corpo, mas ocorrem por via de estimulação ambiental.

Esse paralelo é importante para que cheguemos ao ponto central deste texto: Assim como pessoas diferentes vendo o mesmo vestido tiveram percepções totalmente diferentes, assim pessoas que passam pelas mesmas situações podem ter emoções totalmente diferentes. Este conceito é chave na psicologia clínica: Ninguém reage ao mesmo estímulo da mesma maneira. Ora, isso que parece ser bastante óbvio para um estudante de psicologia, deveras vezes não o é em uma situação de terapia de casais ou famílias, por exemplo, ou mesmo em uma situação onde um paciente com o narcisismo (aqui faço o empréstimo da categoria psicanalítica) não bem resolvido entende que as pessoas devem sentir-se iguais a ela.

A questão é que, o vestido chato do Facebook é mais interessante do que parece, porque exemplifica um princípio básico da psicologia clínica, tornando-o mais acessível inclusive como forma de alegoria para os pacientes que ainda não chegaram a compreensão de que cada sentimento, pensamento ou percepção são qualitativamente únicos no universo.

E a psicologia, assim como a vida, sempre nos surpreende com estas coisas bobas, ao ponto de fazer com que um simples vestido, possa servir de exemplo para a compreensão de um princípio elementar da vida social que pode ser aplicado na clínica, para qualquer leigo ver, ou perceber. Voi-là! Mais uma ferramenta que pode ser aplicada no consultório: Amanhã mesmo, se tiver um casal para atender, com problemas para entender que cada um percebe/sente os mesmos eventos de maneira diferente, talvez compense imprimir tal foto para fazê-los pensar sobre o tema. Não é fantástica a nossa psicologia?!

-------------------
Foto: via G1.com

-------------------
Sobre o autor:

Murillo Rodrigues dos Santos, é psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC Goiás (Brasil), com formação sanduíche e estágio em terapia sistêmico relacional de casais e famílias pela Universidad Católica del Norte (Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados Unidos) e Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela Universidade Federal de Goiás (Brasil). Atualmente é pesquisador pela CAPES/MEC e presidente da Rede Goiana de Psicologia.

Sobre a Rede Goiana de Psicologia

A Rede Goiana de Psicologia é uma organização estadual de coolaboração acadêmica e profissional, criada no ano de 2014 com o objetivo de fortalecer a nossa a psicologia enquanto ciência e profissão através de uma série de projetos. Quer saber mais sobre nós? Clique no link "sobre nós" no menu principal.

0 comentários:

Postar um comentário