No mês de Março de 2015 foi
noticiado no site da Universidade de Lancaster no Reino Unido, que o Dr. Peter
Walker havia realizado uma pesquisa com milhares de imagens e chegou a
conclusão de que o nosso cérebro está “programado” para compreender melhor, ou
que o mesmo se “sente” mais confortável, ao representar imagens em movimento na
direção da esquerda para a direita. Isso explicaria, por exemplo, o motivo de
tantos videogames do estilo side-scrolling (onde a câmera se desloca somente na
lateral), como Super Mário, terem feito tanto sucesso nas décadas de 1980 e 1990.
O autor também sugere que tal
prática teria sido determinante para a convenção do “Itálico” (aquele das
letrinhas do Office Word) para a representação de velocidade e movimento. Também afirma que, mesmo em uma língua onde a leitura ocorre no sentido
inverso ao nosso, o hebraico, a tendência ocorre pelo fato de também haver a
representação do itálico.
De fato, parece que estamos sim
acostumados a ver imagens se deslocar da esquerda para direita, ao passo que as
imagens que se deslocam no sentido contrário parecem nos causar desconforto,
assim como no GIF abaixo:
Agonizante, não?! |
Todavia, eu gostaria de
acrescentar uma pequena crítica à conclusão do trabalho, pela maneira como ela
foi noticiada: Não parece ser algo tão extraordinário! E ainda não me coloco
tão certo de que tal sensação possa se dar de igual forma para quem lê
hebraico, ou outra língua de sentido diferente. O que eu coloco é que existe uma relação intrínseca entre organismo e
cultura, na medida em que um altera o outro – é o velho princípio dialético. O
homem, para dar maior comodidade ao seu organismo, cria ferramentas para
facilitar a sua vida e existência, sendo que o alfabeto é um dos maiores
exemplos disso, na medida em que foi feito para coordenar de maneira simbólica
a sua relação com a realidade.
Neste sentido, na medida em que
as ferramentas criadas pelo homem vão dando maior conforto para a sua vida,
modificando as suas relações com o mundo (por exemplo: Quanto o alfabeto
economiza tempo do ser humano para transmitir informações, na medida em que o
homem não precisa ter que desenhar tudo ou fazer mímicas), seu comportamento
também se modifica, e desta forma, sua própria estrutura biológica também: Outro exemplo disso é o homem que não precisa mais caçar para
viver, podendo comprar as coisas no supermercado, não precisando, portanto, mais desenvolver
um corpo musculoso e ágil, podendo se dar ao luxo de acumular certa gordurinha
localizada, sem ter que se preocupar se isso vai dificultar a sua sobrevivência.
O ocorrido é que o alfabeto é um
divisor de águas na história da humanidade, desde o fato de que a mesma começa
a ser chamada de "história" a partir da invenção da escrita (tudo antes disso era
chamado pré-história). E o cérebro do ser humano foi acostumando-se a “ler”
tais símbolos e a atribuir uma direção na hora de representá-los. Oras, nós que
somos ocidentais, criados em uma cultura linguística de raiz latina, não
devemos nos estranhar ao saber que ler da esquerda para a direita não é a única
forma de se ler no mundo: os semitas (judeus e árabes) leem da direita para a
esquerda; japoneses leem de cima para baixo; e os cretenses (Grécia Antiga)
liam em forma de espiral, já que escreviam em discos (que eram lidos de forma
giratória).
O que quero dizer, para resumir
tudo é que, estamos acostumados a “ler” o mundo em uma direção, e esta nada
mais é do que a influência que a cultura, enquanto conjunto organizado de símbolos/informações, conseguiu “imprimir” no organismo humano, enquanto certas preferências. Assim, fica
fácil compreender porque o estudo do Dr. Walker apresentou tal resultado, na
medida em que a relação entre a linguagem e o cérebro, se torna cada vez mais
clara e verificável. E quanto mais “globalizarmos” costumes (como o caso do
itálico, que foi transferido para o hebraico), mais conexões faremos com nosso
organismo, e mais complexo se tornará o nosso comportamento.
Imagem: Extraída do Google Imagens
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Murillo Rodrigues dos Santos, é psicólogo (CRP 09/9447) pela PUC
Goiás (Brasil), com graduação sanduíche pela Universidad Católica del Norte
(Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados
Unidos) e Fundación Botín (Espanha). Mestrando em Psicologia pela Universidade
Federal de Goiás (Brasil). Atualmente é pesquisador pela CAPES/MEC e presidente
da Rede Goiana de Psicologia.
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